domingo, 13 de março de 2011

Sem rumo, sem direção 

 

Fátima Almeida*
A Agência Globo divulgou há dois dias que o Brasil não aparece com nenhuma instituição entre as 100 melhores universidades do mundo,  segundo o ranking elaborado pela organização Times Higher Education.
A Universidade de São Paulo aparece em 232ª posição e findou por representar toda a América Latina.  A Universidade de Harvard nos Estados Unidos é a líder, com pontuação máxima em todos os critérios. O ranking que foi montado a partir de uma pesquisa  para convidados de mais de 13 mil professores de 131 países reforça a posição dominante das instituições dos EUA e consagra a boa reputação das universidades do Reino Unido e Japão.
A Rússia e a China aparecem entre os cinqüenta melhores. Entre aqueles da 51ª a 100ª posições encontram-se as universidades de países como Coréia do Sul, Seul, Taiwan e Índia. Países estes que executaram um amplo programa de educação baseado nas ciências exatas, chegando a importar, em alguns casos, cientistas de países como Escócia e Holanda, atingindo por isso um alto crescimento no campo técnico-científico.
Como se sabe o Brasil e toda a América Latina foram colonizados por países ultra-católicos que estavam em campanha contra protestantes, judeus, ciganos e hereges em geral, constituindo um verdadeiro exército de missionários, os jesuítas, voltados para a catequese, ficando a seu cargo o ensino no Brasil, por trezentos anos, de acordo com a pedagogia tradicional,  baseada por sua vez na repetição e na memorização enquanto método e conservadora quanto aos conteúdos para impedir que os ventos da ciência moderna chegassem aqui com a  observação, a experimentação, o método analítico, gerando uma sociedade relativamente atrasada e ainda, obediente e passiva quanto à autoridade real.
Manter as comunidades sob a autoridade de Deus e, por conseguinte, de seus representantes na terra, as autoridades eclesiásticas e os monarcas ungidos sempre foi um firme propósito da Igreja Católica, em sua perspectiva de universalismo cristão. A ruptura com esse estado de coisas ocorreu na França revolucionária e demais países  rompidos com a igreja romana, tais como Reino Unido e Estados Unidos da América.
É muito importante que as pessoas compreendam essa vinculação entre a educação enquanto sistema de ensino,  o modo como são ordenados os conteúdos e determinados os métodos de ensino e avaliação e os mecanismos de constituição do Poder. Esse é o calcanhar de Aquiles da sociedade brasileira como um todo, pois,  ao se orgulhar do crescimento econômico não pode esconder suas agudas contradições, em especial a profunda desigualdade social que é produto também da má formação intelectual das camadas médias e baixas.
Todos os anos milhares de jovens se empenham em conseguir vagas nas Universidades públicas como se elas fossem senhoras aristocratas, sem atinar para as diferenças existentes entre elas  precisamente porque são constituí-das nas e pelas sociedades onde estão inseridas refletindo ou reproduzindo seus avanços e retrocessos, seus vícios e virtudes.
Os universitários de hoje em dia não conseguem mais fomentar a mobilização nem os debates nas universidades públicas, estão como que imobilizados como todos os demais setores pelo excesso de individualismo que aportou no Acre, para ficar para sempre, devido ao empreguis-mo na máquina pública, coibindo ou inibindo formas de luta baseadas no coletivo pelo coletivo.
Isso  me parece muito ruim porque o movimento estudantil já foi propulsor de mudanças importantes na sociedade brasileira. Para a minha geração ir para a Universidade tinha o significado de participação e envolvimento com a luta política pela redemocratização e conquistas importantes que, aliás, culminaram com a constituição de 88. Hoje em dia busca-se tão somente um diploma e um emprego, não interessando por quais vias. Cada um por si.
Já ouvimos e até reproduzimos elogios à Zona Franca de Manaus pelo fato de que o emprego na indústria de eletrônicos reduz ou elimina a pressão sobre as florestas, não ocorrendo desmatamento de forma acelerada e gravíssima como ocorre aqui, tanto que o inverno mal terminou e já podemos ver as carretas carregadas de pesadas toras, cruzando  a 364, vindas da floresta estadual do Antimari.
Ocorre que na Zona Franca fabrica-se muito lixo, em última instância, pois os artefatos eletrônicos têm vida curta e seu destino é o lixão. Não há produção de conhecimento, os operários apenas montam e ajustam as peças. Mesmo assim, é inegável que a Universidade do Amazonas, em parceria com o INPA,  ultrapassou a do Acre em matéria de pesquisa sobre potenciais regionais para processamento de forma equilibrada ou sustentável gerando emprego e renda.
Em todos os segmentos da  indústria brasileira, mesmo o de aviões e o de navios, em que pese existir mão-de-obra barata e abundantes matérias-primas, as tecno-logias sempre são importadas. O que explica o fato de que a Universidade brasileira figure entre as últimas.
Não se conhece os critérios do tal ranking, mas, com  certeza se referem à capacidade técnico-científica, essa que  foi inaugurada na era moderna e nunca mais parou de fabricar artefatos, eletrônicos, geringonças de todo tipo para tornar a vida mais confortável, em prejuízo dos ecossistemas no mundo inteiro começando com a destruição dos bosques de cedros do Líbano, das matas de Portugal e Espanha,  e com a destruição da floresta atlântica no Brasil em razão da extração de corante vermelho das árvores de Pau-Brasil para a indústria têxtil e européia, só para nomear os exemplos mais notórios.
O que parece confortável tipo lâmpadas, isopor, plásticos e tudo o mais que é descartável e não biodegradável é produto desse empenho técnico-científico das potências. Portanto, essa má colocação no ranking não deve ser problema nem nos preocupar e sim a demora ou as dificuldades que a Universidade brasileira tem para apresentar um modelo alternativo de pesquisa científica que enfatize a sustentabilidade, permeando todos os campos do saber e enfocando os diversos biomas. Mas ela ainda não sabe o que fazer nem como fazer. E isso é muito pior do que não aparecer entre os melhores no ranking.

[* Acreana, Historiadora, Professora Universitária, Escritora e Articulista da Gazeta do Acre]

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