segunda-feira, 16 de agosto de 2010


Enfim um Promotor de Justiça que faz eco aos Clamores dos Alijados pela Justiça Brasileira:


- Garantismo... só pra quem comete crime? Valha! 



Fernando Martins Zaupa
Promotor de Justiça
Campo Grande-MS

Essa onda laxista de pensamentos, cada vez mais divulgado por alienados engravatados de plantão, que sob vestes jurídicas e discursos verborrágicos para encantar românticos de um mundo fictício (ah, o legislador.. o espírito da lei... a melhor exegese da Constituição..), está tomando dimensões imensuráveis, com enorme e inaceitável estrago à vida em sociedade.

Sob pretexto de se estar a lutar pela garantia da máxima eficiência de preceitos tidos como fundamentais e previstos na Constituição Federal, uma cáfila de auto intitulados juristas ou operadores de direito (que termo...), com lupa iluminista e antropocentrista, despreza a vida em sociedade, a harmonia das relações humanas, o bem comum, enfim, olvida toda a coletividade e valores éticos e morais sociais para, então, fazer de tudo em favor do indivíduo em si considerado.
Se é certo que a Constituição Federal estampa direitos e garantias fundamentais, também é certo que tais direitos não podem – jamais – serem observados cegamente e isoladamente, para que a toda segregação e restrição ao ser humano se buscar, ao máximo, desvencilhá-lo, sem ponderar as valorizações dos móveis que assim ensejaram as medidas restritivas.

Como é sabido, a Constituição Federal de 1988 veio com forte dose de normatização de garantias e direitos fundamentais, ante o contexto histórico então recém atravessado pelo país, de cerceamentos, abusos, violações e toda gama de ofensa dos mais comezinhos direitos dos cidadãos brasileiros.

Agora, em momento social-político-histórico diferente, com prisma opaco, aproveitadores, Polianas e Maria-vai-com-as-outras do Direto, deturpam a real efetividade e alcance de tais normas, para buscar um estado de coisas que beneficia sobremaneira bandidos, criminosos e toda sorte de transgressores das normas criadas para a possível vida em sociedade, em detrimento de uma população honesta, trabalhadora, pagadora de seus tributos, que cumpre as normas e leis, e se vê tolhida de proteção e responsabilização dos violadores de seus direitos.

O que me fomentou a traçar tais linhas, em tom mais indignado, além da diária digressão estampada em peças jurídicas muitas vezes arrepiada por doutos ‘pró proteção máxima do transgressor e dane-se o cidadão vítima’, foi a notícia  da “Decisão do TJ-SP ,que levanta polêmica sobre direito de autor de crime de trânsito fugir do local”
 1.[Leia o caso citado no rodapé da postagem].

Eis a narrativa de que os doutos desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria, trancaram a ação penal que visava a responsabilizar um cidadão que, após atropelar e matar outro cidadão, empreendeu fuga do local, sem prestar socorro.

Como há previsão de crime no Código de Trânsito Brasileiro para quem foge do local do crime, houve a ação penal que, conforme destaca a matéria, foi trancada, sob pretexto..ops... entendimento de que ‘ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo’ e isso afetaria ‘os direitos fundamentais estampados na Constituição Federal”.

Ora, o que está a ocorrer nesse país?

Por que esses direitos fundamentais, tão invocados por esses doutores auto intitulados garantistas, não são tomados em brados - também - para a defesa do outro cidadão (sim, cidadão!) que morreu atropelado e que não teve sequer o ato piedoso e humanitário de ser salvo pelo outro dito ‘cidadão que teve seu direito de não se incriminar protegido’?

Em Direito, não se iludam, é possível se argumentar a favor de qualquer linha de pensamento, já que a legislação, além de conter imensa carga subjetiva, é absurdamente ampla em linhas interpretativas (basta pesquisar as dezenas de escolas exegéticas e métodos de hermenêutica existentes). Assim, porque essa turma – que infelizmente está criando dezenas de fiéis seguidores ante a dose diária via cursinhos e palestras, sem oportunização de outras visões, além de ser ‘a cobrança dos concursos’ – despreza sempre a interpretação que enseja sim a garantia da aplicação dos direitos fundamentais, mas na linha do razoável e proporcional, sem olvidar a preservação dos direitos dos outros e da sociedade?
Esquece o laxista do famoso discursinho ‘a cadeia é escola do crime’ que com essa conversa está a fomentar o crescimento da criminalidade e banalização da leis, e, aí sim, está a acabar com qualquer garantia de direito das pessoas de bem.
Não, não vale entrar em elucubrações mais aprofundadas sobre a visão jurídica (já disse, em direito, no plano hipotético é possível fundamentar o que quiser) desses teóricos de outras paragens e outras realidades (não só de outras nacionalidades, sociedades e culturas, como também de outros planetas...só pode ser!); mas, vale dizer, certamente prestam enorme desserviço àqueles que lutam por seus direitos, esses sim seguindo diariamente as normas, respeitando o próximo e sonhando com uma vida harmônica em sociedade.

Assim, duvide de quem acredita nessa interpretação equivocada do garantismo (o apregoado ‘garantismo tupiniquim’), inclusive já havendo diversos trabalhos a demonstrar que houve (e está a haver) equívoco na difusão em território brasileiro dessa linha de pensamento jurídico, porquanto ou está preso a um dever momentâneo (precisa passar em concursos que só exigem essa visão), ou estão seduzidos pela visão romântica e iluminista do homem em si considerado (ou seria, em nosso caso, como na primeira fase do romantismo, a visão do ‘bom selvagem’?), ou não conseguiram ampliar seus horizontes ante a avalanche de cursinhos-livros-palestras apenas nesse sentido ou, por fim, estão tomados por interesses escusos e nefastos, amparados pela busca do lucro espúrio, decorrente de venda de tais ‘produtos’, de dinheiro de clientes transgressores, lobistas, crime organizado ou preservação de seu cargo e salário, conforme seu dever funcional.
Quando cidadãos comuns e despidos do ranço jurídico me perguntam o por quê de tanta falta de rigor a transgressores da lei e violadores de direitos dos mais variados matizes, com uma notória onda de desrespeito ao dito cidadão de bem, fico querendo entender... ou, então, como destacado acima, até devo saber a resposta... duro é não ter forças – em meu direito fundamental e individual de indignação – para poder mudar a situação...

Faço minha parte... na defesa da sociedade e cidadãos de bem...até vir um garantista tupiniquim para ajudar o transgressor e se somar à horda de aniquiladores dos valores éticos e morais que sonhamos para nós e futuras gerações... se houver futuro...

[*Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul. Formado pela Universidade Estadual Paulista-UNESP. Especialista em Direito Constitucional pela UNAES/FESMPMS. Foi Analista Judiciário Federal pelo TRF 3ª Região, advogado no Estado de São Paulo e promotor de Justiça no Estado de Rondônia.]


1.Decisão do TJ-SP levanta polêmica sobre direito de autor de crime de trânsito fugir do local

Em decisão polêmica, a Justiça paulista mandou trancar uma ação penal em que um homem responde por ter fugido após se envolver em um acidente de trânsito. O argumento usado foi o de que o delito viola a Constituição Federal, que garante a toda pessoa o direito de não produzir prova contra ela mesma.

O tema não é pacífico nos tribunais e envolve o artigo 305 do atual Código de Trânsito Brasileiro, que trata do delito da fuga do local do acidente. A decisão é inédita por ter partido do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, colegiado de cúpula com atribuição política e administrativa no Judiciário de São Paulo.

A decisão do TJ paulista levanta o debate sobre o direito ou não do autor de crime de trânsito fugir do local do delito para não produzir prova que o incrimine. A discussão ganha maior importância diante do acidente que vitimou o filho da atriz Cissa Guimarães, no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro.

Rafael Mascarenhas andava de skate durante a madrugada do último dia 20, dentro de um túnel que estava interditado, quando foi atropelado por um veículo. O motorista não prestou socorro à vítima. O rapaz foi levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos.

“A fuga é a pior prova que o autor do crime pode produzir contra ele”, diz o procurador de Justiça Roberto Alceu de Assis Júnior, do Ministério Público de São Paulo. “É possível sim, incriminar a conduta de fuga do local do acidente e o dispositivo do Código de Trânsito é constitucional”, completou Alceu, ressaltando que "quem não deve, não teme".

Também se manifestando em tese, a desembargadora Angélica de Almeida,[*ela novamente -adendo desta editora]da 12ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, admitiu que tipificar o delito do artigo equivale a obrigar o suspeito ou acusado a se autoincriminar, em flagrante afronta à Constituição Federal.

Entenda o caso em julgamento

O caso em julgamento envolveu um acidente de trânsito ocorrido na altura do km 448 da rodovia Régis Bittencourt, no município de Registro (a 187 quilômetros de São Paulo). O acidente provocou a morte de Leandro Rocha, que pilotava uma motocicleta.

O acidente aconteceu na madrugada de 23 de maio de 2007. O administrador Guilherme Jacob conta que dirigia seu carro, um Land Rover, e quando fazia a ultrapassagem de um caminhão se deparou com a moto. Ele alega fatalidade e diz que a motocicleta estava praticamente parada na pista.

A juíza da 1ª Vara de Registro recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público e instaurou ação penal contra Jacob para que respondesse pelo crime de homicídio culposo (sem intenção de matar), com a agravante de omissão de socorro, e ainda pelo delito de fuga à responsabilidade civil e penal.

A defesa de Jacob feita pelo criminalista Roberto Podval, que atuou no julgamento do casal Nardoni, entrou com recurso no Tribunal de Justiça para o trancamento da ação penal.

Podval argumentou que o recebimento da ação com respeito ao crime de fuga do local do acidente viola o direito Constitucional de qualquer pessoa a não se incriminar.

O recurso de Podval foi parar na 8ª Câmara Criminal que, por votação unânime, aceitou a alegação apresentada pela defesa, mas preferiu que o caso fosse apreciado na forma de incidente de inconstitucionalidade pelo Órgão Especial do Tribunal, com atribuição para tratar do assunto.

A Procuradoria-Geral de Justiça deu parecer contra a pretensão da defesa e pela constitucionalidade do artigo 305 do Código de Trânsito. O relator do caso, desembargador Reis Kuntz, seguiu o entendimento do Ministério Público e votou pelo prosseguimento da ação penal em todos os delitos apontados.

Lamentavelmente ,o desembargador Boris Kauffmann abriu divergência aceitando a tese de inconstitucionalidade. O Órgão Especial é formado por 25 desembargadores e, por maioria de votos, referendou a tese de Kauffmann., e o criminoso permanece  livre. 

[E a Justiça chora...de vergonha]


5 comentários:

  1. Parabéns Doutor, quisera todo o Judiciario assim fosse. Ai teríamos justiça de fato, neste Brasil dos jeitinhos.
    Carlos Roberto Duarte

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Todo o nosso reconhecimento ao Ilmo. Sr.Fernando Martins Zaupa, Promotor de Justiça da cidade de Campo Grande-MS.

    Após diversos noticiários e artigos desalentadores, que mostram o caos em que está mergulhada a sociedade brasileira, o dignísimo promotor aponta fielmente os vícios do magistério jurídico, bem como a má formação de alguns acadêmicos que só fazem tornar mais ambíguas as leis, reinventando interpretações e escapes estratégicos.
    Na falta de um norte, de um alento contra tanta impunidade, sentimo-nos representados por tão competente juízo das coisas.
    A sua sabedoria oportunizou um instante de refrigério em nossa mente atordoada pelo cansaço em crer e esperar.
    Temos, como sociedade civil muito a aprender de suas falas e dissertações do direito.
    Assim, passaremos cada vez mais a crer que ainda há esperança para novos tempos. Há, com a reta e justa interpretação da lei, condições de trazer ao país melhores dias.


    Tenho dito!

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  4. Ilmo Sr. Fernando Martins, parabens pela sua matéria, se o Judiciário estivese composto por pesoas assim, a justiça e o país seriam outros.

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  5. Cara editora desse Blog (de firmeza crítica) e seus leitores:
    Agradeço os elogios e destaco que, em verdade, não são poucos os profissionais que lutam - diariamente - contra essa avalanche de impunidade e má aplicação das leis (o ideal é que fossem ‘todos’, não é mesmo?). Mas, sabendo que estamos a atravessar por período de difícil entendimento ante tantas injustiças e oblíquas e eclipsadas visões por pessoas que deveriam fazer a Justiça, eis que, nos momentos em que a esperança e energias do idealismo são momentaneamente abatidos por decisões desprovidas de senso humano (da vítima e da sociedade, já que para o bandido há imensuráveis vozes a seu favor!), eis que o reconhecimento por parte dos leitores, de estar no 'caminho certo', de estar a atuar de acordo com o 'clamor dos alijados' (como destacou a pessoa que edita o presente Blog no título que redigiu acima a quem novamente destaco o parabéns pela linha ‘pro vida’), é a centelha que alimenta o engajamento e luta em favor das pessoas de bem. É, enfim, a energia que recarrega a força para a continuidade do trabalho e manifestações, ainda que os obstáculos pareçam ser intransponíveis... mas que ora cairão... e caem...ou ao menos abrem frestas... e a beleza da vida –nesse pequeno espaço – tem seu momento de luz! Atenciosamente.
    Fernando Martins Zaupa
    Promotor de Justiça de Campo Grande/MS
    autor do Blog: www.considerandobem.blogspot.com

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