quinta-feira, 28 de outubro de 2010


A TRISTEZA DE MARINA


Fátima Almeida
A Marina Silva só não chegou ao segundo turno porque a ala progressista da Igreja Católica não mobilizou, ressentida porque Marina tornou-se evangélica. Por último, pretendeu que a mesma apoiasse Dilma Roussef.  Mas Marina já tinha dito em entrevista, agosto passado, que o povo brasileiro deveria pensar bem antes de votar em uma pessoa que ninguém conhece. Mas  a verdade é que Dilma Roussef não é conhecida porque sua militância na extrema esquerda durante a Ditadura Militar deu-se na clandestinidade, e mesmo tendo participado da fundação do PDT, organizado debates com FHC e Wefort no IEPES, ligado ao MDB - antes da cisão que gerou o PSDB - sempre atuou nos bastidores. A sua projeção como gestora de minas e energia no Rio Grande do Sul e a rapidez com que se tornou Ministra, e depois chefe da Casa Civil sobressaindo ombro a ombro com o presidente denota que a sua candidatura à presidência é a culminância de uma ascensão meteórica. Não dá para negar.
Muito poucos entenderam o verdadeiro significado dessas eleições e da candidatura Marina Silva que não é assentada num mero carreirismo, mas, numa proposta consolidada, transnacional, trabalhada por movimentos sociais articulados do mundo inteiro que lutam para reverter por toda parte esse modo de submissão do Estado tão somente aos interesses do capital com sua lógica sempre perversa, impedindo a expansão do capitalismo via restrição ao uso abusivo dos recursos naturais não renováveis.
O sistema capitalista não pode mudar a si mesmo, não pode deixar de ser excludente senão não seria capitalismo. Sob a sua ótica a Amazônia não é vista como um ecossistema  com uma função vital na manutenção das condições favoráveis à vida para todos os habitantes do planeta, com suas variadas espécies, em equilíbrio cada vez mais precário. Para o capitalista a palavra Amazônia significa tão somente madeira, lucros contemplados pela extração, beneficiamento, exportação, fabricação de artefatos, construção, entre outros. Para eles é um armazém que se pode saquear indefinidamente, como se quiser bastando ter capital, com ajuda e apoio de governos e políticos despreparados ou incompetentes ou corruptos.
 A exploração de madeira na Amazônia não pode ser vista sob um critério  quantitativo, um desenho no mapa,  uma área uniforme, que se pode ir diminuindo  de forma desorganizada e caótica, ou de forma organizada como nos tais planos de manejo. A Amazônia nunca é pensada como um organismo vivo que possui especificidades múltiplas, complexas, variáveis, e ao mesmo tempo interligadas ou estruturadas de tal modo que a simples pesca de uma espécie de peixe não pode ser projetada sem estudo seguro sobre as implicações ou conseqüências de tal atividade para com o ecossistema e ainda, as suas interligações com os diversos ecossistemas da região e depois do mundo todo.
Nesse sentido quaisquer políticas que dêem apoio sistemático e permanente às populações ribeirinhas, extrativistas, das áreas indígenas, são bem vindas e necessárias, porque o grau de concentração demográfica é ínfimo e seu impacto não é ameaçador como ocorre com grandes projetos como o mais recente, do apresentador Ratinho e do consórcio de empresas as quais ele representa, com a concessão pública de 150 mil quilômetros quadrados para exploração de mogno. Mesmo essas políticas são atravessadas por corrupção praticada por lideranças menores,  mas,  nem por isso,  menos nocivo.
Essa mesma perspectiva é necessária a quaisquer políticas de exploração ou proteção nos outros biomas, tais como cerrado, oceanos, etc.. Todo o espaço territorial que já foi devassado, ocupado, de forma legal ou ilegal, para os fins típicos do sistema capitalista ultrapassaram os limites do possível ou suportável para a manutenção desses ecossistemas. Urge impedir o avanço da frente devastadora e reordenar todo o espaço territorial já devassado desde 1500.
Os danos são analisados e até monitorados por cientistas que não participam das decisões políticas num Estado que se reduz a mero mantenedor do equilíbrio das finanças, via incentivos fiscais, fiscalização, exportação e importação, dentro de uma lógica que se exerce de forma autônoma sem contemplar as questões sociais e ambientais que são duas faces da mesma moeda. Sem contar que o sistema educacional instituído neste país favorece e muito à perpetuação da distancia entre ciência, critica da ciência e povo. Nada se fez até hoje, nesse país para um salto de qualidade no sistema da educação formal. Não se faz nunca os investimentos necessários para uma educação capaz de superar esse distanciamento e alçar a maioria a uma condição de observador e crítico ao mesmo tempo, cidadão atuante e não um apátrida a receber esmolas do Estado. Só se faz escolhas insensatas movidas pelo carreirismo político que se perpetua botando seus ovos, quase sempre no mesmo nicho familiar.
 O Lulismo se exerce sobre os princípios do neoliberalismo e da globalização, com as multinacionais fazendo jogo de gato e rato nos países emergentes para forçá-los a uma subordinação permanente, a escamotear as contradições para manter uma estabilidade à custa do silêncio, da omissão e do imobilismo. O mérito do Lula foi negociar com os banqueiros uma pequena fatia do bolo para esfarelar e dirimir a miséria absoluta dos apátridas. Como ele mesmo afirmou após receber uma sonora vaia durante carreata por bairros nobres de Belo Horizonte foram os ricos que mais ganharam dinheiro em seu governo. Só que o seu estrelato no exterior que ele tanto cultiva vai chegar ao fim porque tudo chega ao fim, Brigitte Bardot está obesa e velha. E Dilma, se eleita irá á Ópera em camarote de honra.
Isso porque a força motriz dessa campanha tão acirrada e desesperada é o Pré-Sal, uma jazida de petróleo estimada em cem bilhões de barris, por enquanto, que vai tornar o Brasil o país mais poderoso do mundo. Investidores nacionais e estrangeiros estão com as mãos em brasa para investir tudo no pré-sal, o que explica o desespero dos petistas, ante a possibilidade de Serra gerenciar esse processo. Vai mudar o eixo econômico das arábias para a América Latina. Mas o modelo é o mesmo de há duzentos anos, produção e consumo de combustíveis que lançam gases de efeito estufa na atmosfera. Como controlar o desvario e a insanidade capitalista nesse processo de exploração. A quem confiar? Dilma ou serra? E como é que os Verdes que apóiam Dilma foram se comprometer com tanta energia suja?  Marina não botou o pé na lama, mas já sabe que vai ficar tudo muito mais difícil, pois vai ter tanto dinheiro e venda de almas que o projeto de energia limpa vai acabar ficando de molho. Daí, sua tristeza.

*Fátima Almeida,é Professora e Historiadora Acreana

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